JERUSALÉM – Em um discurso no Knesset, parlamento de Israel, na última segunda-feira, o presidente Donald Trump proclamou o “amanhecer histórico” de um novo Oriente Médio. O pronunciamento ocorre após o anúncio de um cessar-fogo na semana passada, que resultou na interrupção dos bombardeios israelenses em Gaza, no início da libertação de reféns israelenses pelo Hamas e na permissão para a entrada de ajuda humanitária na região. Adicionalmente, estão em andamento preparativos para a soltura de aproximadamente 2.000 prisioneiros palestinos detidos por Israel.Estas medidas, que constituem a primeira fase do plano de paz de Trump, representam um passo significativo ao frear, pelo menos temporariamente, os planos da extrema-direita israelense de expulsar os palestinos de Gaza.Contudo, a realidade no terreno é desoladora. Nos últimos dois anos, Gaza foi arrasada: mais de 10% de sua população foi morta ou ferida, 90% dos habitantes foram deslocados e 78% de todas as estruturas foram danificadas ou destruídas. O sistema de saúde entrou em colapso, com 95% dos hospitais inoperantes, e a infraestrutura educacional foi dizimada, com 90% das escolas afetadas. Diante desse cenário apocalíptico, centenas de milhares de palestinos deslocados começaram a retornar para o que restou de suas casas e bairros.Um Plano Vago e de Difícil ExecuçãoO plano de paz de 20 pontos apresentado por Trump é notavelmente escasso em detalhes. Ele estipula que Israel não “ocupará ou anexará Gaza” e que o Hamas não terá “qualquer papel” na governança. Para a transição, o plano propõe uma autoridade de tecnocratas liderada pelo ex-primeiro-ministro britânico Tony Blair, supervisionada por um “conselho de paz” presidido pelo próprio Trump. O objetivo final seria o retorno da Autoridade Palestina para governar a faixa, abrindo um “caminho confiável para a autodeterminação e a criação de um Estado palestino”.Essa promessa vaga de um “caminho” para a independência remete a negociações passadas, onde a menção a um futuro Estado palestino serviu mais para mascarar uma realidade de ocupação e conflito do que para promover uma solução concreta, o que, previsivelmente, levou à escalada de violência dos últimos anos.Perspectivas e CeticismoApesar do acordo, as motivações dos principais atores geram ceticismo. O foco principal de Trump durante as negociações tem sido a libertação dos reféns israelenses, com pouca empatia demonstrada pelo sofrimento dos civis palestinos. Assim como seu antecessor, Joe Biden, Trump vetou resoluções do Conselho de Segurança da ONU que pediam um cessar-fogo.O governo israelense, liderado por Benjamin Netanyahu, também encara o acordo primariamente como um meio de recuperar os reféns. O cessar-fogo e a retirada parcial das forças armadas de Gaza são vistos como o preço a ser pago. Não há garantias de que os extremistas no governo de Netanyahu tenham abandonado seus planos expansionistas para Gaza e a Cisjordânia, o que aumenta o risco de violações do acordo sob qualquer pretexto.Do lado palestino, a pressão para que o Hamas aceitasse a libertação de todos os reféns já na primeira fase foi imensa, uma mudança significativa em relação à sua exigência anterior de uma retirada israelense completa. Acredita-se que o Catar e a Turquia tenham persuadido o grupo de que manter os reféns se tornara uma desvantagem estratégica.Para alcançar uma paz duradoura, seria necessária uma mudança fundamental na política externa dos EUA, que historicamente protegeu Israel das consequências de suas ações que violam o direito internacional. Embora um presidente pouco convencional como Trump possa, teoricamente, quebrar esse padrão, presumir que ele tenha o interesse, a capacidade ou a habilidade para resolver um conflito de décadas é, neste momento, um ato de esperança.
